Texto de Gênero Memórias Literárias, que está concorrendo a nível estadual.
Aluno: Rafael dos Santos Silva 8º ano A
Profª: Valdeniza Macedo Barbosa
A honra como troféu
Ainda
no início da conversa com seu Popô pude observar que seria fácil nosso diálogo,
mas o pausar na sua voz, e suas feições, tinha um lamento, uma dor. De repente uma
brincadeira, um sorriso, e tudo se transformam, no compasso em que contava sua
história:
_Lembrar
dói... Dói muito... É tão profunda a dor que machuca a alma, e faz calar a voz.
Não
diferente de crianças que hoje existe por ai. Vim de uma infância sofrida, sem
amor ou palavra de carinho, marcada pelo abandono de meus pais, aos meus dois
anos de idade. Criado por padrinhos, espancado e explorado no trabalho infantil
nos roçados, sob o calor escaldante da seca do nordeste, na velha Caruaru, em
Pernambuco.
Ali vivi uma infância que não desejo a criança
alguma. Muito distante do mundo de hoje, com tantas tecnologias, robôs que são
brinquedos, vídeo game, computador, celular. Nunca me deram um brinquedo! Quem
me dera ter um carrinho do um e noventa e nove. Eu brincava com a enxada, lima
e uma moringa de barro. Muitas vezes o cabo da enxada era o meu cavalinho.
Naquele
tempo estudar era difícil, distante, e eu não tive este direito, acontecia de
eu estudar apenas três meses por ano, muitas vezes por não ter professor. Hoje
meus filhos, vocês tem tudo e precisam valorizar o professor e a escola que
tem.
Ali
era só trabalho, a única alegria era à feira-livre, onde vendia de tudo: carne
seca, maxixe, jerimum, macaxeira e animais vivos, lá eu ficava extasiado com os
gritos dos feirantes. Naquela época não existia aparelho de som, e a propaganda
era feita no gogó mesmo!
Que
tempos aqueles, foi dali que ainda quase menino fugi de casa, e me larguei no
mundo, como um andarilho sonhador, desses que ate hoje existe, e encara os
sofrimentos da vida sem perder a esperança.
Como não havia os ônibus de agora, de pau-de-arara, ou de carona, viajei sem destino,
trabalhei aqui ou ali, de forma honesta. Aprendi na escola da vida, que o
trabalho enobrece o homem e a fé fortalece o cristão.
Cheguei a Naviraí nos meados de 1963, pequena
vila, um fio aquoso e tênue de esperança, cercada por mágica floresta, coberta
por cipó de flor lilás, que perfumava o ar. Personificação de Deus e sinônimo
de beleza. Puro encantamento! E eu a admirar. Em seu seio o Rio Amambaí
caudaloso saracoteava, seus peixes dançavam ao redor de uma fonte límpida de
puro cristal, os pássaros cantavam em coro a mais bela melodia. Que saudade me
dá!
Lembro-me
da casinha de pau- a- pique, com piso de chão batido. O fogão de lenha, o candeeiro,
da estrada de chão, e até do vestido de chita da minha mulher, minha amada,
minha companheira. Porém tudo se transformou! Antes mata hoje cana, luz
elétrica, asfalto, prédios, lindas praças, Naviraí tornou-se uma linda dama.
Se bem me lembro do menino fugitivo. Ele
também teve seus amores. Casei-me duas vezes, e quatro filhos ganhei: anjos
lindos, cândidos. E me achando merecedor
Deus deu-me a graça maior, três crianças abandonadas que adotei como filhos
meus, e criei com muito amor.
A
água que hoje chega às casas pelos canos e torneiras, antes chegava pelo trabalho
duro do poceiro, que eu fazia cavando o chão. E mesmo sem estudo, me aventurei
na politica, ganhei para vereador, trabalhei com muita garra, e pudor. Por
vinte anos labuto no mundo politico, mas nada é como antes, tempos em que um fio
de bigode de um homem indicava o seu valor.
Hoje
aos setenta e três anos, e com o diabete vencido, minha memória tão cheia de
poços, e tão congestionada, no meu coração cheio de marcas esta a certeza de
que amo o lugar onde vivo e por ele continuo a trabalhar, e como presidente da
associação do meu bairro, cuido dele com carinho.
Revendo
minha história, tirei dela uma lição. Peripécia alguma me desviou do bom
caminho, sou dono do mais rico troféu que um homem pode ter na vida. A minha
honra.
Relendo a história do seu Popô viajo por um
caminho de luta e superação, e me vejo diante do espelho da vida.
Texto
baseado na entrevista feita com o senhor Apolônio Candido dos Santos (seu Popô)
de 73 anos de idade.
Profª Valda e Rafael